RECEITA 3×10

Musculação não é massa de bolo, para ter receita!

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Por: Yuri Motoyama

Um ponto, no mínimo curioso, sobre a musculação é a relação entre as séries e o número de repetições. Eu coloco a mão no fogo se algum de vocês que está lendo esse texto já não fez um treino de musculação com 3 séries de 10 (3×10) com a mesma carga e um minuto de intervalo. Ou se você é professor, duvido que nunca tenha passado para um aluno 4×15, por exemplo. Certamente um número de repetições precisa ser estabelecido para que se tenha um volume alvo de treinamento. Porém a pergunta que fica é: será que um bom treino de musculação precisa ter a rigorosidade das repetições fixas?

Acho que já contei esse caso aqui (ou comentei em um podcast), mas vou contar de novo pois tem a ver com a postagem. Em um congresso, meu orientador assistia uma palestra do professor Fleck. Durante sua palestra ele apresentou um dado dizendo que não haviam condições de se manter um mesmo número de repetições utilizando a mesma carga de trabalho. Se isso acontecesse ou o praticante se “poupou” nas primeiras séries realizando 10 repetições quando poderia ter feito 15 ou a carga está realmente desajustada. Logo, a carga interna seria subestimada. Dando sequência na apresentação, o professor Fleck apresentou outro dado, em outro contexto, falando que o grupo de pesquisa dele realizou um trabalho com uma metodologia tal e foi feito 3×10. Aí meu orientador levantou a mão e perguntou: Mas o senhor não acabou de falar que 3×10 com carga fixa não corresponde a uma carga interna real?

Todos os “fãs” olharam torto para meu orientador e o professor Fleck teve que se virar para não perder o rebolado. Deve ter sido um congresso bem interessante…rs

Mas como as famosas 3×10 podem não corresponder a uma carga interna ideal?

Isso acontece com qualquer tipo de “série x repetições”, não especificamente os 3×10 que vou utilizar como exemplo. Mas imagine que existe uma carga interna e uma carga externa de treinamento. A externa são os pesos, barras e o que utilizamos para fazer resistência. A carga interna é como aquela resistência afeta o nosso organismo a ponto de produzir as adaptações que estamos procurando (força, hipertrofia, resistência muscular, etc).

Quando fazemos o teste de 1 repetição máxima (famoso 1RM) o protocolo determina 5 minutos de intervalo. Esse intervalo serve para que exista uma maior possibilidade de ressíntese de fosfato de creatina e um maior efeito de tamponamento da acidose promovida.

Veja o exemplo de uma pesquisa sobre que observou a relação das 3×10 com carga fixa e o desempenho.

Em um trabalho publicado pela equipe de pesquisa da Universidade Federal do Rio de Janeiro junto com a University of Northen Iowa Health mostraram a necessidade da redução de carga quando o objetivo é trabalhar com repetições fixas.

Após um teste para determinar as 10 repetições máximas, todos participantes realizaram um treinamento composto pelos exercícios: supino com peso livre, puxador na polia e agachamento com peso livre. Trinta e dois participantes (mulheres) realizaram 4 condições experimentais, sendo elas: a) 3×10 com carga constante; b) 5% de redução da carga  inicial em cada série subsequente; c) 10% de redução da carga  inicial em cada série subsequente; e d) 15% de redução da carga  inicial em cada série subsequente. Foi respeitado o intervalo de 1 minuto entre as séries e 2 minutos entre os exercícios.

Resultados

Carga constante: quando se mantém a carga constante, o desempenho cai quando comparamos as séries subsequentes. O praticante não consegue realizar as 10 repetições com a mesma carga em todas as séries.

5% de redução a cada série: Houveram diferenças para cada  tipo de exercício. Considerando os 3 exercícios houve uma redução no desempenho da segunda para a terceira série.

10% de redução a cada série: O puxador e o agachamento conseguiram manter o desempenho no número de repetições nessa condição experimental.

15% de redução a cada série: Nessa faixa de redução o efeito foi contrário, houve um aumento no desempenho, ou seja, o número de repetições aumentou conforme a carga foi reduzida.

Qual a recomendação, trabalhar com 3×10 (séries fixas) ou não?

Outros estudos citados no trabalho mostram a necessidade de se realizar as repetições dentro de uma faixa alvo. Porém vários fatores como número de repetições alvo, grupo muscular, intervalo de descanso e a quantidade de carga reduzida por série irão influenciar nesse controle. Com relação ao intervalo de descanso a literatura recomenda ao menos 2 minutos de intervalo para conseguir manter o número de repetições utilizando uma carga fixa.

Geralmente os volumes e intensidades associados a resultados de hipertrofia e resistência muscular, vão envolver treinos com séries múltiplas e intervalos curtos (30 a 60 segundos). Outro ponto importante a ser considerado é a utilização desses protocolos com cargas e repetições fixas para pesquisa. Seja tanto na pesquisa quanto na prática diária vale a pena repensar no que tradicionalmente vem sendo prescrito.

Mas cuidado! 3×10, 4×15, “X”x”X” não são formulas de bolo! Isso tudo é mais uma pecinha para colocarmos no nosso quebra cabeças da periodização do treino ou mais uma pulga atrás de nossas orelhas.

 

Referência

WILLARDSON, Jeffrey M.; SIMÃO, Roberto; FONTANA, Fabio E. The effect of load reductions on repetition performance for commonly performed multijoint resistance exercises. The Journal of Strength & Conditioning Research, v. 26, n. 11, p. 2939-2945, 2012.

Fonte: http://4×15.com.br/

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